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    23.5.2012

    Segunda reportagem da série sobre a indústria brasileira mostra por que isso acontece.

    Edição do dia 22/05/2012
    22/05/2012 21h18- Atualizado em 22/05/2012 21h18
    TONICO FERREIRASão José dos Campos, SP

    A cotação do dólar é uma preocupação constante da indústria brasileira, porque afeta não só os produtos importados que competem com os nacionais aqui dentro, mas também o preço dos produtos que o Brasil exporta. Nessa competição com outros países, a nossa indústria entra em posição de desvantagem.

    A indústria brasileira moldou o Brasil moderno. É um patrimônio construído com esforço e audácia. Surgiu pequenininha no século XIX e ganhou impulso no século XX, principalmente a partir dos anos 1940, com a criação da nossa primeira grande siderúrgica, em Volta Redonda, no estado do Rio.

    Em 1949, a indústria representava apenas 10,9% da economia do país. Em 1961, passou para 19,2% e atingiu o auge em 1986: 27,2%. Cresceu amparada por incentivos governamentais e barreiras que impediam a entrada de importados. Depois passou por crises e reestruturações até chegar a uma participação semelhante à do fim dos anos 1950. No mínimo, a indústria enfrenta um momento de dificuldade. A pergunta é: qual seria a causa?

    Entre os suspeitos de sempre, está o câmbio. A moeda americana recuperou valor recentemente, está acima de R$ 2. Mas, nos últimos anos, teve cotações muito baixas. Isso deixou os importados mais baratos. As fábricas daqui, sem ter preço para competir, diminuíram de tamanho ou mesmo fecharam. Mas, paradoxalmente, se com o dólar barato as importações explodiram nos últimos dez anos, as exportações também cresceram.

    As importações subiram de US$ 47 bilhões em 2002 para US$ 226 bilhões no ano passado. As exportações saíram de US$ 60 bilhões para US$ 256 bilhões. Por isso, importadores brasileiros dizem que a indústria não tem do que reclamar.

    "Bens de consumo correspondem a apenas 17% de tudo o que o Brasil importa. A grande maioria do que o Brasil importa são insumos industriais, máquinas, equipamentos, que se destinam à própria indústria. É por isso que eu não vejo a importação como uma inimiga da indústria. Pelo contrário", avalia Ivan Ramalho, presidente da Associação dos Importadores (Abece).

    Mas, de outro lado, a pauta das nossas exportações mudou. Passamos a vender uma proporção maior de produtos primários, como minério de ferro e soja, e menor de bens manufaturados ou semimanufaturados. Do lado das importações, passamos a comprar uma proporção maior de bens de consumo, como roupas, bebidas e automóveis.

    "A gente faz carros, fazemos soja. Mas a gente faz soja a um custo muito mais baixo do que a gente faz carro. Então, quando a gente cresce consumindo mais do que produz, a diferença, ou o carro ou a soja, vai ter que vir de fora. Vai vir de fora aquela coisa que relativamente a gente faz um pouco pior, que é carro nesse caso, e não soja", explica o economista Samuel Pessoa, da FGV do Rio de Janeiro.

    Além do câmbio, existem outras causas que tornaram a indústria brasileira menos competitiva, da pouca poupança interna ao transporte caro e ineficiente.

    O ex-ministro Delfim Netto compara um industrial chinês com um do Brasil, como se eles estivessem carregando pesos. Ele diz que na soma de impostos, juros e valorização do real, o brasileiro carrega o equivalente a 88 quilos nas costas. O chinês carrega apenas 17 quilos de impostos, que encolhem para quase zero com os juros baixos e moeda artificialmente desvalorizada:

    "Quer dizer, o brasileirinho está com 88 quilos na cabeça. O chinês está no ar. Agora, corre que vai ter uma competição legítima. Aí o brasileiro cai e o chinês continua voando."

    A indústria brasileira tende a ficar atrás de suas concorrentes também porque ainda não tem a quantidade de mão-de-obra especializada exigida em áreas mais sofisticadas da produção.

    Na Coreia, de acordo com a OCDE, 12% das pessoas na faixa de 55 a 64 anos têm curso superior; entre 25 e 34 anos, 58%. Dá para ver que houve melhora significativa entre a geração dos pais e a dos filhos. No Brasil, isso não aconteceu; 9% entre os mais velhos têm curso superior contra apenas 11% entre os jovens.

    "Vai ter uma indústria de máquinas no Brasil? A gente vai ter. A gente vai ter uma indústria de semicondutores no Brasil? Não, a gente não vai ter. Vai ter uma indústria de química fina no Brasil? Não, a gente não vai ter. Porque a gente não tem gente preparada para fazer esse tipo de coisa", diz o economista Alexandre Schwartsman.

    Mas, então, como é possível que o terceiro maior fabricante de jatos comerciais do mundo fique em São José dos Campos, no interior de São Paulo? O Brasil só conseguiu criar uma indústria aeronáutica de ponta e competitiva porque pôs lado a lado a produção, o instituto de ensino para formar engenheiros e um centro de tecnologia. As três áreas interagiram. Daí o sucesso.

    "Não é um privilégio da indústria aeronáutica. Isso pode ser aplicada na indústria automotiva, na indústria têxtil, na indústria de mineração. É absolutamente geral o caso de, através da colaboração, a gente avançar na fronteira tecnológica para se manter competitiva no mercado", conclui Mauro Kern, vice-presidente da Embraer.

    http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/05/industria-brasileira-compete-em-posicao-de-desvantagem-no-mercado.html

    Fonte Internet: Globo.com, 22/05/12